Representação Mental
Uma
representação mental é um símbolo cognitivo interno hipotético que representa a
realidade externa. Entendida como o processo pelo qual o ser humano cria na
mente um modelo do mundo real ou um estado mental.
É a
unidade básica do pensamento, isto é, o poder de pensar e imaginar o conceito
sem ele estar presente. Através da representação mental o sujeito organiza o
seu conhecimento.
O que
seus pais representam para você? O que o casamento representa para você? O que a
religião representa para você? O que o trabalho representa para você?
É
normal que em uma sociedade haja uma representação diferente das demais porque
o contexto é diferente. É o mesmo processo com um indivíduo: a representação
que ele criou está aliada ao seu contexto. Se ele não foi estimulado a ser
resiliente, essa representação pode até desestruturá-lo mentalmente.
Cabelo como exemplo de
representação mental
Um bom
exemplo disso é o filme Felicidade por um Fio (2018), onde a personagem principal
passa por uma transição capilar. Para ela, o alisamento representava a perfeição, uma vez que sua mãe sempre criticava seus cabelos crespos. Ao raspar a cabeça e deixar o cabelo crescer naturalmente, ela se vê livre dessa busca inalcançável por perfeição e passa por um processo de autoconhecimento se permitindo errar, aprender, progredir e ser feliz.
Apesar de parecer um exemplo superficial, geralmente são
assim que são percebidas as representações mentais. Não é o cabelo em si, mas o
que ele representa.
Por exemplo, quando você ouve ou lê a frase “não
imagine um cabelo louro”, você automaticamente visualiza esse cabelo. Nossos
cérebros automatizam as informações para facilitar nossa vida. O que às vezes
pode causar um equívoco, pois não houve tempo para uma análise mais detalhada.
A representação que fazemos pode não ser fiel a realidade.
Quando
você lê “cabelo” que tipo de cabelo você imagina? Preto? Louro? Colorido? Ele
está solto ou preso? Ele é de um homem ou de uma mulher? Por que você imagina
primeiro um tipo para depois o outro? Isso acontece porque não captamos o mundo
exterior diretamente, mas construímos representações mentais dele.
Sim, o
cabelo tem a sua importância biológica: assim como todos os pelos – pubianos,
cílios, sobrancelhas e etc. – o cabelo serve para proteger a região da cabeça,
onde fica o nosso órgão mais importante e amenizar impactos. Mas para além
disso, ele é uma boa ferramenta de identificação, desde a sua cor relacionando
a povos e regiões até a revelação da idade aproximada e de quão saudável a
pessoa está.
No exército,
por exemplo, o cabelo é cortado por uma questão de praticidade, para que os fios não interajam com os equipamentos nem atrapalhe o campo de visão do soldado. Mas o efeito colateral dessa ação é tirar a identidade, a individualidade do soldado tornando-o mais
vulnerável e distante de si para aceitar novas ideias e ser doutrinado, sendo
uma ferramenta de desassociação para implantar uma nova ideologia. Associado aos gritos
de guerra e hinos, a identificação visual desenvolve mais facilmente empatia, formando e fortalecendo vínculo, passando a ver o outro como igual e entendendo que aquela é sua nova família a quem deve proteger.
Isso
se repete no budismo, mas com razões um pouco diferentes: os monges raspam a
cabeça para se desapegarem de suas vaidades e de si mesmos para se perceberem
como parte mutável do Universo – e para combater piolhos também, uma vez que
Buda era um andarilho.
Já no
caso das mulheres chinesas, penteados indicavam seu estado civil: dois coques
indicava uma moça virgem e descompromissada (e por isso esse penteado é muito
associado a crianças), enquanto que um, indicava uma moça que já estava apta
para o casamento.
Muçulmanas
escondem seus cabelos pelo mesmo motivo: estado civil e desapego da sua
individualidade porque é pregado no Corão que uma boa esposa seja virtuosa por
suas atitudes e não vaidosa ou ostensiva, logo, sua identidade só deve ser
mostrada para as pessoas íntimas (marido e família).
Em
outras regiões e culturas, com as revoluções industriais pós-guerra, foi útil
para o crescimento da economia que a mulher não fosse apenas dona de casa, mas
que trabalhasse fora e por questões práticas, cortassem seus cabelos. Como essa
era uma prática que andava contrária a cultura da época, a indústria da beleza
usou um discurso revolucionário da mulher moderna para que elas sentissem maior
aceitação ao mudar de penteado – moda – e que muda até hoje de acordo com os
interesses que convém.
A vaga
que hoje não é ofertada para um tipo de cabelo amanhã será, se, culturalmente,
ele for bem aceito. Mas para isso precisamos estar familiarizado com ele, sem
ter associações negativas associadas ao caráter.
É
curioso notar que, enquanto algumas mulheres alegam praticidade ao raspar a
cabeça, alguns homens usam a mesma alegação para não cortar o cabelo e deixa-lo
crescer. O que eles entendem por “praticidade”? O que a praticidade representa perante
seus gêneros? O que o cabelo representa para eles?
Ou
seja, nossa individualidade pode ser vista pelos demais como uma quebra de padrão, um defeito de
fábrica que impossibilita a convivência harmônica e familiar, capaz de causar o
caos na sociedade. Nesse caso, o cabelo simboliza a liberdade.
Sim, o
cabelo é um amortecedor e um protetor térmico natural que não deixa os raios
ultravioletas fritar nosso cérebro e nem congela-lo em situações de
temperaturas negativas. Mas de fato o cabelo – e qualquer outra coisa – tem o
poder que damos a ele (o que pode ser uma benção ou uma maldição).
Tirar à força as representações que criamos pode ser desestruturante. Representações mentais não devem ser julgadas como boas ou ruins, mas
respeitadas e analisadas a fim de entendermos o contexto de um indivíduo e dar a ele
melhor qualidade de vida e de saúde mental.
Cena do filme "Felicidade por um fio".
Referências:
Eysenck, Keane. Manual de Psicologia Cognitiva.
Naomi Wolf. O mito da beleza.
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